por onde andará, hoje, aquele mineiro das gotas de sangue? passei a noite a procurá-lo, a ele e ao aborto - a única coisa que permanece viva na minha memória após tantos anos; após aperceber-me e lembrar-me, justamente esta noite, do que me fazia buscá-lo, mesmo que nunca tivesse sabido se algum dia fui pouco mais que um vulto. onde estará o mineirinho...
nossa diferença de idades nem devia ser tanta, aí para uns cinco anos, no máximo, e ele vivia no mundo do qual eu não ousava fazer parte. porque: é sempre tudo muito triste para ser contado. (mas naquele tempo eu não sabia serem as explosões em meu peito algo, um chamado, uma direção. o esôfago contraía-se, a respiração cessava, o coração a pulsar em todas as extremidades... - não! por que não consigo ser uma pessoal normal, gostar da vida e não da morte? a morte... é... apenas... o princípio..., a morte é castanha..., ali, logo ali, as cortinas a moverem-se numa tarde sem brisa)
escondi-me por detrás de fórmulas matemáticas e equações químicas, agarrando o fio da esperança de encontrar-me ali, nos números, nos elementos, nas leis da física que têm a mania irritante de querer explicar tudo. tentei partir, esqueci-o
agora, depois de trilhar tantos percursos que jamais imaginava, o menos esperado de tudo é ter caminhado em círculos. talvez seja verdade o que dizem os alquimistas, aquilo que está em cima é igual ao que está embaixo, e, depois de muito peregrinar, volto ao ponto de partida para perceber que meu coração nunca realmente saiu de lá. sinto uma gota na nuca: o sangue enegrecido com as dores e os encantos, mais preparado e venoso para voltar aos portões do mundo à volta do qual costumava vagar, espreitando com olhos luminosos os poucos seres que um dia estiveram em meu lugar, outros, nas profundezas, que nunca conseguiram sair e espiar a vida dentre humanos que sentem pavor pelo lado obscuro.
como pude empurrar tudo para um canto esquecido da minha mente, na esperança de abafar os gritos que ninguém mais ouvia? como pude demorar tanto para me dar conta de que não é uma questão de reprimir um lado incompreensível demais para a lógica, não era e nunca foi! afastava-me da essência que sempre esteve incrustrada aqui, por todos os lados, nos olhos e nos tecidos, desde que tenho consciência de que existo. e, se eu tivesse parado para refletir um pouquinho que seja, veria que não havia outro destino - senão este.
20070903
submundo
# 01:08:00
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